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02/11/2023

Contribuição sindical assistencial

O ano era de 1996 e eu estava sentada diante do Dr. Eugênio Roberto Haddock Lobo, que naquela manhã me aplicava prova oral para ingresso nos quadros da OAB. O tema que me coube foi Direito Sindical. A partir daí a minha história com sindicatos se tornou cada vez mais constante do ponto de vista profissional, não poucas vezes lembro daquela prosa no meio dos meus estudos, respostas às consultas ou sustentações no plenário dos Tribunais.

Imagino – ou melhor, sequer posso imaginar – o que falaríamos hoje sobre o recente julgamento do STF, na corrente constitucional da livre associação por categoria (artigo 8º, II) e liberdade sindical (artigo 8º, V), que ainda vigoram na Carta Magna.

É como um ‘de volta para o futuro’. A reforma trabalhista, em boa hora, avançou tornando opcional a contribuição aos sindicatos e, diga-se, aplicando a liberdade sindical, tornando a participação do empregado junto ao sindicato uma verdadeira contribuição e não um imposto arbitrário.

Mas, 6 anos após veio o retrocesso, não apenas voltou a ser obrigatória para sindicalizados e não sindicalizados, mas o pesadelo é pior, alguns sindicatos criam a contribuição pela oposição.

E não se pretende aqui propagar muito menos negar a importância e necessidade dos sindicatos e acordos coletivos, como inclusive desde muito prestigiado na Constituição Federal.

Tanto assim que a própria reforma trabalhista tratou de elencar os direitos – na maioria constitucionais – que não poderiam ser negociados sob pena de nulidade.

Assim faço a seguir breves palavras sobre o assunto, sem o compromisso de esgotar a questão, por demais polêmica e sem qualquer conteúdo relacionado com grupos sociais que integram a nação.

Notas sobre a (in)constitucionalidade da contribuição assistencial aos empregados não sindicalizados. Por que não debater sobre a mais democrática pluralidade sindical? =

Breves notas sobre livre associação prevista e vigente na Constituição Federal e a contribuição assistencial agora imposta pelo STF a todos os integrantes da categoria econômica, na forma prevista na norma coletiva de sindicato, cujo trabalhador pode não ser sindicalizado, desde que respeitado o direito de oposição.

Sim, exatamente isso. Bem andou a reforma trabalhista a dar a liberdade de associação aos trabalhadores, naquele momento nasceriam ou sobreviveriam os verdadeiros e fortes sindicatos. E o mundo sequer sabia dos desafios de uma pandemia devastadora que estava por vir.

Desde as priscas eras Vargas, a verdadeira contribuição sindical era imposta por lei, não cabendo discussão, tampouco autorização pelo empregado, e o empregador tinha a obrigação de fazer o desconto de um dia de trabalho no mês de março e repassar ao sistema sindical representativo da categoria para subsidiar a representação dos empregados pela entidade, correspondente a uma por unidade federativa, ou seja, uma atividade econômica por território não inferior a um município (princípio adotado no Brasil da unicidade sindical). Vamos nos limitar as categorias preponderantes. Não cabe aqui, por ora, tratar das categorias diferenciadas.

Já em outros países, que denotam certo avanço, aplica-se a pluralidade sindical, verdadeiramente democrática, onde cada trabalhador elege o sindicato que irá lhe representar, independente da categoria, mas isso é matéria para outra nota.

Voltando ao frigir dos ovos, não há discussão quanto à natureza jurídica da contribuição sindical prevista na CLT, tratava-se de imposto, pois era obrigatória fazer retenção no salário (pelo empregador) e repassar ao Sindicato (o empregado não poderia se opor), era um imposto compulsório.

A reforma trabalhista trouxe a faculdade para o trabalhador, democraticamente, por sua livre manifestação de vontade, que deliberasse sobre a sua representação ou não, na linha constitucional da liberdade de expressão prevista na Constituição Federal. A contribuição passou a ser facultativa, respeitando-se o princípio da unicidade sindical. Ou seja, um único sindicato por categoria, para o qual o empregado deveria se dirigir espontaneamente e pagar sua contribuição e assim reconhecendo aquele como seu representante e substituto processual, nos casos das demandas judiciais.

Certamente aqueles que não demonstrassem o interesse na representação processual não poderiam ser substituídos pela entidade que não os representavam, básico como tem que ser.

Ao arrepio de todo o histórico da luta e das conquistas dos trabalhadores, combinado com a falta de conhecimento técnico sobre as tantas nomenclaturas dadas as diversas contribuições, taxas, sindicais, assistenciais, negociação e fontes de custeio, que infelizmente vieram ao longo do tempo, somando-se ao arbítrio das entidades, hoje temos uma contribuição assistencial “facultativa”, prevista em assembleia da qual os empregados tenham ou não participado, podendo ser fonte de oposição pelos empregados, em valor muito superior ao antigo um dia por ano de salário e inclusive sendo descontada daqueles que não são sindicalizados.

E durma-se com essa (in)segurança jurídica: a norma coletiva será aplicada arbitrariamente ao empregado ainda que não sindicalizado, o qual terá obrigatoriamente deduzido de seus proventos o valor da contribuição “facultativa” e representado por quem não entende como seu substituto inclusive processualmente.

Assim, o imposto sindical (CLT) obrigatório e cuja monta servia para subsidiar a máquina da entidade e manter as equipes organizadas para os eventos anuais de data base e discussão de prerrogativas das categorias, deixou de ser para considerar que o valor era utilizado em atividades recreativas e que a contribuição sindical era aquela que verdadeiramente mantinha o sistema sindical.

Se aos operadores do direito é complexo compreender tamanha destreza por demais engenhosa, quiçá aos trabalhadores, e o que se dirá dos empresários que passarão a cumprir cláusulas e cláusulas obrigacionais com empregados que sequer sindicalizados são; diante do resultado das inesgotáveis reuniões de debates sindicais, que por certo serão acalmados nas assembleias.

Para que a ordem e o progresso avancem de forma pacífica, democrática, a norma teria que ser aplicada apenas, repita-se, somente àqueles que optaram por ser representados pelo sindicato da categoria e ainda assim por aqueles que concordassem previamente com o desconto em seus proventos. Somente esses poderiam ser representados pelo subscritor do instrumento.

Mas há esperanças, no último dia 03/10/23 a CAE (Comissão de Assuntos Econômicos) do Senado Federal aprovou o PL 2.99/2023 que impede os empresários de exigirem o pagamento da contribuição sindical sem autorização do empregado. Democrático como tem de ser.

O projeto agora segue para a CAS (Comissão de Assuntos Sociais) em caráter terminativo, ou seja, se não houver recurso de plenário e for aprovado, irá para a Câmara dos Deputados. Segundo o texto aprovado, o empregador deve apresentar ao trabalhador por escrito qual é o sindicato que representa sua categoria e o valor da contribuição assistencial que será cobrada. Os trabalhadores que optarem por não contribuir não podem ser cobrados.

E, o mais importante! Aguarda-se a modulação dos efeitos da decisão do STF, ainda não publicada, enquanto Sindicatos já propõe, de fato, cobrança retroativa 5 anos, percentuais inimagináveis de contribuição assistencial e multa de R$ 150,00 para a oposição. Alô, embargos de declaração! Sepultaram o trânsito em julgado. Cautela, meus Senhores, cautela. E parece que esqueceram do artigo 462 da CLT x direitos não elencado no artigo 611 ou em contrapartida a estabilidade. Seguimos. —redigido antes da publicação do acórdão do STF—.

. Por: Ana Cristina Grau Gameleira Werneck, sócia da Gameleira Pelagio Fabião e Bassani, Sociedade de Advogados, localizada no Rio de Janeiro, possuindo especialização há 30 anos na área trabalhista. | https://gameleirapelagio.com.br