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20/09/2023

Criação de estatal para gerir ferrovias é aposta para revitalizar o setor

Durante a 29ª Semana de Tecnologia Metroferroviária, em São Paulo (SP), presidente da Ferrofrente defendeu uma nova política de investimento no modal com o apoio do poder público.

Uma grande articulação pela criação de uma política nacional de desenvolvimento ferroviário no Brasil teve início no dia 12 de setembro (terça-feira). Durante a 29ª Semana de Tecnologia Metroferroviária, realizada em São Paulo (SP), o presidente da Frente Nacional pela Volta das Ferrovias (Ferrofrente), engenheiro José Manoel Ferreira Gonçalves, defendeu a criação de um amplo sistema de trens de passageiros em todo o País, gerido por uma empresa estatal.

Gonçalves detalhou a proposta durante a palestra “Conselhos Gestores como suporte para o ingresso e maior protagonismo do setor ferroviário”, ministrada na tarde do dia 12 de setembro (terça-feira), durante o evento promovido pela Associação dos Engenheiros e Arquitetos do Metrô.

A Semana de Tecnologia Metroferroviária reuniu alguns dos principais players do setor, tanto do setor público quanto privado, como empresas de logística, estatais de transporte coletivo e fornecedores de produtos e serviços. A defesa de uma nova política ferroviária para o país chamou a atenção do setor e abriu um novo canal de discussão política para o tema das ferrovias.

—Em todo o planeta, considerando os países com dimensões continentais, Brasil possui um atraso de mais de 50 anos no setor ferroviário. Além disso, é o único país do mundo que não oferece trens para viagens de passageiros em longas distâncias— afirmou o presidente da Ferrofrente.

Gonçalves frisou que a recuperação desse tempo perdido não se faz sem investimentos, mas requer disponibilidade para o debate em busca do modelo ideal para o Brasil. —Precisamos da sociedade civil também unida para reconhecer que o serviço poderá transformar a realidade de muitos municípios, levar desenvolvimento, gerar emprego e renda. É preciso avançar no debate sobre a essencialidade dos serviços e nos projetos que atendem a todos os cidadãos brasileiros—.

Durante a palestra, Gonçalves destacou a necessidade de criar uma empresa estatal para gerir as ferrovias brasileiras. Segundo ele, existe uma opção moderna e eficaz. —Vale dizer que temos um ponto de partida. Há modelos adotados em países e continentes com realidades muito distintas, mas que já reconheceram a necessidade de o estado intervir para garantir investimentos no setor—

Ele citou, como principais exemplos desse modelo, países tão díspares quanto a China, com políticas fortemente calcadas pelo planejamento estatal, quanto os Estados Unidos, conhecido pelas suas práticas liberais e incentivo à iniciativa privada.

“A estatal dos EUA, a Amtrak, já prevê o repasse de 3,4 bilhões de dólares em 2024. Trata-se de um modelo de gestão ferroviária com mais de 50 anos, gestado pelo Congresso americano, durante o governo do (ex-presidente Richard) Nixon”.

Ele também citou Canadá, Índia, Coréia do Sul e Rússia como outros bons exemplos. —Esses são países que adotaram as suas estatais, que repassam periodicamente recursos financeiros para as operações ferroviárias—.

Estudo aprofundado — A defesa de uma nova política para as ferrovias tem como base um estudo feito pelo economista José Tavares de Araújo, falecido recentemente, intitulado “Perspectivas do setor ferroviário no Brasil: um confronto com o resto do mundo”. O trabalho foi apresentado ao então secretário Nacional de Transporte Ferroviário, Leonardo Ribeiro e marcou um passo importante para a adoção de uma nova política ferroviária no país.

O levantamento traz um raio-x do setor ferroviário no país, suas potencialidades e fragilidades, bem como os vetores que devem ser enfocados nesta nova política ferroviária proposta pela Ferrofrente.

Entre os pontos destacados no estudo, também está a importância das ferrovias para a consolidação de uma economia sustentável economicamente. —O mundo também tem olhado para as condições climáticas, para o dever de criar políticas sustentáveis. A ferrovia é um modal que acompanha essa dinâmica para o desenvolvimento, com menos carbono— pontua Gonçalves.

Durante a palestra, ele apontou alguns fatores que emperram o desenvolvimento ferroviário do país: Malha ferroviária de pequeno porte — Considerando a extensão total da malha ferroviária no Brasil, ainda estamos abaixo de países como a Argentina, França e África do Sul. O Brasil tem 21 mil km de estradas de ferro em operação. Isso é menos de 10% do que existe na Europa ou nos Estados Unidos, por exemplo—.

Pequena fração de movimentações — Na comparação de matrizes de transporte de carga apenas 17% das movimentações são feitas por ferrovias aqui. Esse percentual é bem maior na Austrália, com 43%, na China, 37% e Canadá (46%). A falta de vagões faz com que a produção seja escoada pelas rodovias, mantendo altos os índices de impacto ambiental e desfavorecendo as estatísticas sociais para o desenvolvimento das cidades—.

Pouca diversidade no transporte de cargas — “Enquanto nos EUA e Europa são movimentadas uma grande diversidade de cargas, aqui, os minérios são cerca de 70%. Grãos ocupam entre 10% e 17%.”

Forte concentração do setor — Precisamos encontrar saídas para variação de players. Atualmente, nossas ferrovias são controladas por quatro grandes companhias (Rumo, MRS Logística, VLI, Vale), que percorrem menos de 40% do território brasileiro, para escoar minérios e produção agrícola, em grande parte. Em outros países, que incluem os serviços de transportes de passageiros, há um estímulo constante à concorrência—.

O engenheiro José Manoel — O Eng. José Manoel Ferreira Gonçalves é engenheiro civil, advogado, jornalista e escritor. Pós Doutorado em Sustentabilidade e Transportes, pela Universidade de Lisboa, em Portugal. Doutor em Engenharia de Produção. Mestre em Engenharia Mecânica. Idealizador e presidente da Ferrofrente – Frente Nacional pela Retomada das Ferrovias e da Aguaviva – Associação Guarujá Viva. É diretor de relações jurídicas e legislação da FNE – Federação Nacional dos Engenheiros e Conselheiro do Movimento EngD, Engenharia pela Democracia. Concorreu à presidência do Crea-SP nas eleições de 2020 com uma proposta de fortalecimento da engenharia do Estado e do País e da defesa dos interesses dos profissionais registrados no sistema Confea/Creas.