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06/08/2025

Os impactos das sanções da Europa à Rússia

Em 1º de julho de 2025, entrou em vigor uma rodada de sanções da União Europeia que impõe tarifas escalonadas sobre fertilizantes de origem russa e bielorrussa, elevando as alíquotas de 6,5% a quase 100% ao longo de três anos. Para determinados produtos agrícolas, será aplicada uma tarifa adicional de 50%.

O principal objetivo dessas medidas é limitar recursos financeiros que sustentam a ofensiva russa na Ucrânia e proteger a segurança alimentar da UE, reduzindo a exposição a possíveis ações coercitivas de Moscou. A Comissão Europeia afirmou que a iniciativa apoiará a produção doméstica e permitirá a diversificação do fornecimento de outros países.

Considerando que a Rússia é um dos principais exportadores mundiais de fertilizantes nitrogenados, as mudanças devem impactar toda a dinâmica do comércio global e afetar diretamente o agronegócio brasileiro, que importa cerca de 85% dos insumos que utiliza. Ao mesmo tempo em que se abrem janelas de oportunidade comercial, surgem ameaças significativas à sua cadeia de suprimentos e à sua competitividade externa.

Para agravar ainda mais o cenário de instabilidade, em 15 de julho o secretário-geral da Otan, Mark Rutte, advertiu que países que continuarem negociando com a Rússia, incluindo o Brasil, poderão sofrer sanções secundárias de 100% sobre seu comércio, caso não haja avanços nas negociações de paz.

Para as empresas do setor, o desafio do momento é ajustar compras, estoques e contratos, diversificar fornecedores e proteger margens, considerando as múltiplas variáveis desse novo contexto – que detalhamos a seguir.

1. Competição acirrada por fertilizantes deve elevar preços globais — Em 2023, 25% das importações de fertilizantes nitrogenados da UE vieram da Rússia. Com as novas tarifas, essas compras devem ser redirecionadas para mercados como Canadá, Marrocos e Egito – os mesmos que abastecem parte do agronegócio brasileiro.

A disputa tende a elevar ainda mais os preços globais dos insumos e pressionar as margens de lucro do agro, com possível impacto no preço dos alimentos. Além disso, o Brasil passará a competir diretamente com um comprador que possui maior capacidade de barganha e subsídio interno.

2. Mudanças impactam logística de transporte e custo de frete — A reconfiguração das rotas logísticas, com a redução de volumes nos portos do Báltico e Mar Negro, levará ao redirecionamento de cargas para instalações no Canadá, Marrocos e Egito. O Brasil, que também importa desses países, pode enfrentar maior tempo de espera, escassez de espaço em navios e tarifas de frete ainda mais elevadas, impactando diretamente a janela de plantio e a previsibilidade de custos para os produtores.

Os custos logísticos, já pressionados por tensões geopolíticas, tendem a ser repassados integralmente para o produtor brasileiro, que verá sua margem de lucro ser ainda mais comprimida, a menos que haja renegociação de contratos de longo prazo e diversificação urgente das fontes de fornecimento.

3. Pressão cambial deve elevar custo do crédito — O orçamento da UE destinado à defesa, com foco em armamentos, munições e infraestrutura militar, saltou de aproximadamente €59 bilhões em 2021 para mais de €102 bilhões em 2024. Essa militarização orçamentária de grandes blocos econômicos afeta o custo de capital internacional e eleva o risco global, refletindo-se em maior volatilidade cambial e aumento de juros em operações de financiamento rural atreladas ao comércio exterior.

O agronegócio, dependente de financiamento para custeio e investimento, pode enfrentar dificuldades em acessar crédito barato, além de ver seus contratos atrelados ao dólar se tornarem mais arriscados.

4. Prêmios do mercado de seguros podem aumentar — O mercado de seguros já sofre com aumento de prêmios em apólices de risco agrícola e de transporte internacional, em função da instabilidade dos corredores logísticos. A nova dinâmica comercial exige uma resposta coordenada entre governo, produtores, seguradoras e instituições financeiras, com reforço aos instrumentos de hedge cambial, fundos garantidores, aumento da cultura de seguro e maior oferta de crédito rural subsidiado.

5. Riscos diplomáticos e comerciais — As ameaças de sanções secundárias pela Otan criam uma variável política nas decisões de compra. Mesmo que ainda especulativas, essas medidas podem levar o Brasil a reavaliar contratos com fornecedores russos para evitar retaliações, gerando incertezas que afetam a formação de preços e o planejamento de longo prazo do setor.

6. Oportunidades para exportações brasileiras — Por outro lado, o redirecionamento de recursos da Política Agrícola Comum para defesa pode reduzir a produção interna da UE em até 12% até 2030, de acordo com estudos da Comissão Europeia. Essa retração abre espaço para maior importação de grãos, carnes e açúcar, segmentos nos quais o Brasil é líder mundial e possui capacidade para atender à demanda adicional. Desde que consiga atender aos critérios técnicos e ambientais do mercado europeu, o país se posiciona como fornecedor natural em um momento de enfraquecimento da autossuficiência agrícola do bloco.

Para o Brasil, as necessidades são claras: garantir estabilidade no fornecimento de fertilizantes e energia, buscando novos mercados além da Rússia, ampliar exportações de produtos agrícolas para a Europa e reforçar sua imagem ambiental para se manter como fornecedor confiável. Os produtores precisam agir estrategicamente para aproveitar as oportunidades, sem ignorar os riscos que esse novo ciclo global impõe sobre sua estrutura agroindustrial.

Por: Raphael Juliace Magalhães, Líder de Agronegócios na Marsh Brasil.