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03/07/2025

Como estreitos e canais se tornaram as novas moedas de troca no comércio global

O especialista em comércio exterior Jackson Campos analisa o cenário dos principais canais comerciais do mundo e explica porque há tanto interesse no controle deles.

Com o conflito entre Israel e Irã escalando, o controle do Estreito de Ormuz entrou em pauta quando o país persa anunciou o fechamento da passagem, uma das principais rotas de comércio de petróleo do mundo. O anúncio da obstrução da área trouxe questionamento sobre o interesse e quem toma conta dos principais canais e estreitos do mundo, responsáveis por facilitar o comércio global.

Existem quatro passagens mais estratégicas e influentes para o comércio global: o Canal de Suez, o Canal do Panamá, o Estreito de Malaca e o Estreito de Ormuz. Muito influentes, quase 50% de tudo que é transportado por navios no mundo passa por pelo menos um desses pontos, em algum momento do trajeto. O especialista em comércio exterior Jackson Campos explica por quais motivos esses canais são usados frequentemente como moedas de troca.

— Controlar uma dessas rotas não é só questão de logística, é estratégia global. Os países que detêm ou influenciam esses corredores podem barganhar mais facilmente com outros mercados, ditar o ritmo do mercado e do comércio global. Eles são de vital importância para o comex e, quando há distúrbios em um deles, toda a logística mundial é afetada, aumentando preços de frete e, consequentemente, deixa mais caro o preço final da mercadoria —diz Campos.

O Canal de Suez, por exemplo, é um dos mais afetados recentemente com os conflitos envolvendo os Houthis, grupo rebelde que está estabelecido no Iêmen. Sendo fundamental para o comércio entre Ásia e Europa, as companhias têm evitado a região, fazendo a volta pelo sul da África e empilhado custos em fretes mais altos e maior duração do transporte de carga.

O Canal do Panamá é tema discutido dentro do governo americano, que desde o retorno de Trump à presidência tenta reaver o controle da passagem. Essencial para o comércio entre as Américas, Ásia e Europa, o canal reduz em semanas o tempo de viagem entre as costas leste e oeste e é extremamente estratégico para os EUA. Com os olhos da China também voltados para o canal, os americanos reforçaram a presença na área e causam tensão com alegações de uso do local para vigilância chinesa.

— Hoje, com tantos conflitos acontecendo em zonas próximas a esses gargalos, vemos o quanto a logística está vulnerável a pressões políticas e militares. Não se trata apenas de rotas de navios, mas de linhas vitais de suprimentos que, se interrompidas, impactam economias inteiras— analisa Campos.

Segundo ele, os países que têm proximidade ou presença militar nesses pontos passam a ter um poder de influência desproporcional. —Quem controla essas passagens consegue impor suas regras ao comércio global. Por isso, elas se tornam prioridade na geopolítica e alvos de disputas silenciosas ou abertas entre grandes potências— afirma.

No caso do Estreito de Ormuz, a escalada do conflito entre Israel e Irã trouxe à tona um dos maiores medos do mercado internacional: o fechamento total da principal saída de petróleo do Golfo Pérsico. Responsável por aproximadamente 20% de todo o petróleo comercializado por mar, o estreito foi temporariamente bloqueado por forças iranianas em resposta a ataques israelenses, interrompendo o tráfego de grandes petroleiros.

Isso fez os preços do petróleo dispararem e forçou países como China e Índia a reverem seus estoques e rotas alternativas de fornecimento. Os EUA, por sua vez, aumentaram a presença militar na região para garantir a liberdade de navegação e proteger seus aliados no Golfo.

— Uma paralisação total nesta região provocaria um verdadeiro efeito dominó na economia global. Com um possível bloqueio, o preço do barril pode disparar, impactando diretamente o valor dos combustíveis, o custo do frete e o preço final dos produtos. Para o Brasil, isso significaria aumento no preço da gasolina, do diesel e até de alimentos. O transporte de cargas por navios também fica mais caro, o que afeta as exportações e importações brasileiras. Além disso, empresas que dependem de produtos vindos do exterior podem enfrentar atrasos e escassez de insumos —explica Campos.

Diante de um cenário tão delicado, a única alternativa sustentável para preservar a fluidez do comércio global é a via diplomática. As grandes potências sabem que uma crise prolongada em qualquer uma dessas rotas pode desencadear um efeito dominó sobre a economia mundial, afetando desde o abastecimento de energia até a produção industrial em escala global.

— Essas regiões são como artérias do sistema circulatório do comércio e, se uma delas entope, o corpo inteiro sofre. Por isso, manter o diálogo aberto, garantir a segurança das rotas e buscar soluções diplomáticas é vital não apenas para os países envolvidos diretamente, mas para toda a economia global. A diplomacia nessas áreas não é opcional, é uma exigência do mundo interconectado em que vivemos —finaliza Campos.

Perfil — Jackson Campos é diretor de Relações Institucionais da AGL Cargo, Campos atua com comércio exterior e relações governamentais há anos, o que o coloca em posição de destaque para abordar quaisquer desdobramentos relacionados à importação, exportação, comércio exterior e lobby. O especialista que também é Fellow do CBEXs possui facilidade em explicar todos os processos e etapas que fazem parte do ciclo de vida de um determinado produto, desde a movimentação de seus insumos até a sua entrega no cliente, desvendando dados, estatísticas e revelando os percalços do comércio exterior. | https://jacksoncampos.com.br