Mas pode estar afetando segmentos específicos, diz Icomex, da FGV IBRE.
— No Icomex de abril comentamos a sequência de eventos pós o anúncio de Trump no dia 02 de abril das tarifas de reciprocidade. A trégua concedida por três meses para os países com tarifas acima de 10% e a escalada da guerra tarifária com a China que culminou com uma tarifa de 125% imposta pela China às importações dos Estados Unidos e de 145% imposta pelos Estados Unidos às importações chinesas. O nível tarifário significaria a paralisação do comércio entre as duas maiores economias do mundo, o que iria alimentar as expectativas de uma possível recessão global. O próprio governo chinês anunciou que iria parar com a escalada tarifária que não fazia mais sentido. Nos Estados Unidos cresceu a pressão das empresas que utilizam bens chineses nas suas cadeias de produção, como o setor automotivo, e as grandes e pequenas redes de varejo voltadas para consumo final, onde os itens chineses dominam vários segmentos, como brinquedos.
No dia 11 de maio (domingo), China e Estados Unidos anunciaram uma trégua de 90 dias com tarifas de 10% impostas pela China aos produtos dos Estados Unidos e de 30% pelos Estados Unidos de importações oriundas da China.
A trégua sinaliza que um cenário catastrófico com a guerra tarifária levando a uma paralisação do comércio e recessão mundial está no momento fora do radar. Igualmente relevante mostrou que há possibilidade de se chegar a um acordo mais duradouro. Um acordo que não irá restaurar os níveis tarifários pré-Trump, mas que viabilizará os fluxos de comércio, com custos mais elevados.
As incertezas diminuíram em relação ao início de abril. No entanto, em relação ao mundo antes de Trump, o cenário para o comércio mundial deteriorou com a quebra das regras mínimas para a sustentabilidade de uma relação de trocas “não conflituosa/harmoniosa” entre os países. Trump impôs a lei do mais forte para forçar acordos e, exceto a China e, em menor medida a União Europeia, outros países não têm poder de retaliação.
A análise da balança comercial irá procurar identificar possíveis mudanças nos fluxos de comércio em função do cenário Trump. Adiantamos que na análise dos agregados de exportações e importações no comércio com a China e com os Estados Unidos não é possível afirmar que esses efeitos já se apresentem. Os contratos de comércio exterior não são de curtíssimo prazo e o cenário de incertezas gerado pela dança das tarifas não é propício a grandes decisões de mudanças nos fluxos de comércio. Não se descarta conforme relatos publicados na imprensa que algumas empresas/segmentos possam já estar antecipando e/ou presenciando algum aumento nas exportações para os Estados Unidos (caso de calçados e têxteis) ou aumento de entrada de produtos chineses no mercado brasileiro. No entanto, seria um efeito que até o momento não aparece numa análise agregada.
A Balança comercial de abril — Os dados da balança comercial de abril registraram um superávit de US$ 8,2 bilhões, próximo ao de abril de 2024 que foi de US$ 8,4 bilhões. No acumulado do ano até abril, a diferença é maior: US$ 17,7 bilhões em 2025 e US$ 26,9 bilhões, em 2024. O déficit acumulado com a China no primeiro bimestre do ano de 2025 (US$ 3,4 bilhões) contribuiu para a queda do saldo da balança comercial. Nesse mesmo período em 2024, o saldo com a China foi positivo em US$ 5,0 bilhões. Nos meses de março e abril, a diferença foi menor e ambos os saldos foram superavitários: US$ 8,6 bilhões (2024) e US$ 7,8 bilhões (2025). Por coincidência, a diferença do superávit da balança comercial do primeiro quadrimestre de 2024 e 2025, no valor de US$ 9,2 bilhões, é igual à diferença dos saldos bilaterais com a China no mesmo período, US$ 13,6 bilhões, em 2024, e US$ 4,4 bilhões, em 2025.
A queda no superávit no acumulado até abril reflete o menor dinamismo das exportações em relação às importações. Em termos de valor, as exportações recuaram 0,7% entre os primeiros quadrimestres de 2024 e 2025 e as importações cresceram 10,4%. Nesse mesmo período as exportações aumentaram em volume 0,4% e as importações 13,6%. Na comparação mensal, as importações cresceram 1,6% e as exportações caíram 0,3%, em termos de valor. No caso do volume, as exportações recuaram em 1,0% e as importações cresceram 3,7%. A queda nos preços é mais acentuada nas importações e o preço das exportações aumentou na comparação mensal de abril.
O pior desempenho das exportações está associado a um recuo no volume exportado das commodities tanto na comparação mensal (-2,8%) como na do acumulado do ano até abril (-2,7%). Na direção contrária, cresceu o volume exportado das não commodities, 4,1% (mensal) e 7,5% (acumulado). Como as commodities explicaram 66% do total exportado no primeiro quadrimestre do ano, o aumento das não commodities não compensou a perda com as exportações das commodities. Favoreceu também as exportações das não commodities em abril, aumento de preços em 5,8%, enquanto para as commodities foi registrada queda de 0,9%. O mesmo ocorre na comparação dos preços nos primeiros quadrimestres dos anos de 2024 e 2025: queda de 3,6% (commodities) e aumento de 4,2% (não commodities).
O aumento das importações é explicado pelo desempenho das não commodities, que explicaram 92% do total importado pelo Brasil no primeiro quadrimestre de 2025. Em volume, aumentaram 5,3% na comparação mensal e 15,0% na do acumulado do ano até abril. As commodities recuaram em 10,2% (mensal) e cresceram 0,3% no quadrimestre. Chama atenção a queda nos preços importados das commodities, 15,3% (mensal) e 9,7% (quadrimestre). O recuo nos preços das não commodities ficou em 0,5% (mensal) e 1,8%, quadrimestre.
O desempenho das exportações está associado às commodities e, portanto, as principais contribuições são da agropecuária e da indústria extrativa. Em termos de volume, na comparação mensal foi registrada queda na agropecuária (-3,8%) e aumento na extrativa de 1,1%. Na comparação do acumulado até abril, aumento da agro em 0,6% e queda na extrativa de 5,9%. O recuo nos preços de exportações das commodities é explicado pela extrativa, com quedas de 4,8% (mensal) e 8,2% (quadrimestre). Os preços na agropecuária aumentaram: 5,5% (mensal) e 2,5% (quadrimestre). Em termos de valor, as exportações da agropecuária cresceram 2,8% e da extrativa recuaram 13,4%, na comparação dos acumulados (Gráfico 4).
As exportações, em volume, da indústria de transformação cresceram 3,6% no quadrimestre e 0,1%, quase estagnada, na comparação do mês de abril de 2024 e 2025. Em termos de valor, aumentos de 1,9% (mensal) e 4,1% (quadrimestre). As vendas externas da transformação explicaram 56% das exportações totais do Brasil, mas essa participação e o aumento registrado não foram suficientes para compensarem o pior desempenho da agropecuária (21,4% das exportações) e da extrativa (22,5%).
O desempenho das importações é explicado pela indústria de transformação, que explica quase a totalidade das compras externas do Brasil, 93% no primeiro quadrimestre de 2025, seguida da extrativa (5%) e da agropecuária (3%). Iremos concentrar a análise na transformação.
Em valor, as importações da transformação aumentaram 4,3%, 5,7% em volume e os preços recuaram 1,2%, entre abril de 2024 e 2025. Na comparação interanual do primeiro quadrimestre de 2024 e 2025, as variações foram: valor +12,8%, volume +15,6% e queda de 2,2% nos preços. Desde janeiro as variações, em volume, comparadas com igual período de 2024 foram: +17,1% (janeiro); +20,2% (fevereiro); +5,1% (março) e +5,7% (abril). O mês de fevereiro foi atípico com a compra de plataformas flutuantes da China. Se compararmos o desempenho até o momento das importações com as variações no ano de 2024 não é possível afirmar que estamos assistindo a um surto de importações.
Quais os principais produtos importados? Pelos dados divulgados pela Secretaria de Comércio Exterior, não se identifica uma mudança de pauta. No mês de abril, foram, em ordem de participação: adubos (participação de 5,5% e com variação positiva em relação a abril de 2024 de 36,2%); óleos combustíveis (part. 5,0% e queda de 11,9%); medicamentos (3,7% e var. de +28,5%); motores e máquinas não elétricos (part. de 3,6% e cresc. 25,9%); e parte e peças para automóveis (part. 3,5% e variação +0,9%).
Algumas comparações entre o desempenho importado da China e do Brasil. Primeiro, na última coluna registramos as variações de volume das importações totais do Brasil por CNAE 2.0. Artefatos de couro cresceram 26,4%, veículos 17,8% e máquinas elétricas, 16,1%. Depois analisamos a participação das importações chinesas no total das importações brasileiras e não identificamos mudanças nas estruturas. No caso de artefatos de couro, a participação inclusive caiu de 37,6% para 27,8%. Como sabemos que os preços de importações da China recuaram em 6,1% na comparação mensal e 21% para bens duráveis, essa queda na participação e o crescimento em valor de 6% para esse segmento pode refletir preços. A elaboração dos índices de volume por CNAE está em preparação na base do IComex.
Como já mencionamos, a contribuição da China para a queda do superávit do Brasil.
O desempenho no primeiro quadrimestre do ano pelos principais mercados mostra que a China liderou o aumento das importações, +36,6%, seguida dos Estados Unidos, +12,9%. Nas exportações, a liderança foi da Argentina, crescimento de 51,8%, enquanto para a China e os Estados Unidos foi registrado queda e para a União Europeia aumento de 3,2%. O caso da Argentina é explicado tanto pela valorização do peso em relação ao real como pelo comércio intraindústria do setor automotivo. Como já comentado no Boletim anterior, o resultado para a China foi influenciado pela importação de plataformas flutuantes em fevereiro. Os preços das importações aumentaram em todos os mercados exceto na China e os das exportações caem em todos os parceiros, exceto Estados Unidos.
A evolução da variação interanual mensal das exportações e importações do Brasil com a China e os Estados Unidos. Escolhemos a partir de outubro de 2024, quando a eleição já estava definida para Trump. Na comparação do valor exportado, o desempenho da China em 2025 segue a sazonalidade esperada. Em março, o registro foi positivo (+8,1%), mas em abril é negativo.
Como os preços de exportações têm seguido uma trajetória de queda em relação ao ano passado, interessa analisar o volume. O resultado na comparação do quadrimestre, como mencionado, foi um recuo de 2,9%. Em janeiro e fevereiro, o volume caiu 23,1% e 13,1% e cresceu 11,3% e 7,1%, em março e abril. Espera-se que o efeito do tarifaço de Trump deverá começar a ficar mais presente nos resultados a partir de maio.
No caso dos Estados Unidos, a trajetória do volume variou de recuos em janeiro (-11,8%) e março (-16,4%) com ganhos em fevereiro (+17,0%) e abril (+13,2%).
A comparação no valor importado mostra crescimento nos dois mercados, mas a variação da China sempre supera a dos Estados Unidos, exceto em março e abril. Em março, o aumento das importações foi de 17,7% para os Estados Unidos e 9,4% para a China. E, em abril, 14,0% para os Estados Unidos e 7,6% para a China.
Quando analisamos a variação dos volumes, observa-se que, exceto em março, a variação do volume importado da China supera sempre o dos Estados Unidos. As maiores diferenças foram em janeiro, China (+27,1%) e Estados Unidos (+9,4%) e fevereiro, China (+92,0%) e Estados Unidos (+19,8%). Em março, as variações foram próximas: Estados Unidos (+15,7%) e China (+14,4%) e em abril, China (+15,4%) e Estados Unidos (+8,5%).
O fato de a variação do volume importado da China ser superior ao dos Estados Unidos tem sido uma tendência clara da série histórica desde o início dos anos 2010. O que se quer observar é se o tarifaço levou a um aumento mais acentuado das importações chinesas ou um possível aumento nas exportações para os Estados Unidos, numa perspectiva macroeconômica, onde só analisamos os agregados. Nesse caso a resposta é negativa. Os contratos de comércio exterior não são de curtíssimo prazo e o cenário de incertezas gerado pela dança das tarifas não é propício a grandes decisões de mudanças nos fluxos de comércio.
No entanto, como salientamos para segmentos específicos e empresas, o efeito do aumento das importações chinesas pode estar ocorrendo e a análise por volume por setor de atividade é que permitirá analisarmos com mais detalhes esse resultado.
Por último a recente visita do governo brasieiro à China com assinatura de abertura de mercados para alguns produtos agropecuários e perspectivas de aumento do investimento chinês no Brasil será um fator que deverá impulsionar ainda mais as trocas comerciais entre os dois países— conclui o FGV IBRE.