Hoje o Brasil parou. E não foi por greve, feriado ou tempestade. Foi por algo invisível: um colapso na nuvem. O apagão cibernético na Amazon Web Services (AWS) mostrou, mais uma vez, o quanto o varejo moderno é brilhantemente digital e perigosamente dependente. Marketplaces, bancos digitais, apps de saúde, programas de benefícios e até companhias aéreas foram fortemente impactados pela mesma falha: a da infraestrutura que promete nunca falhar.
Nesta manhã de 20 de outubro de 2025, a AWS sofreu uma falha crítica em sua principal região, na Virgínia (EUA), e isso afetou serviços diretos ao consumidor em aplicações de Mercado Livre, Wellhub, Amazon, RD Saúde e diversos outros sistemas em nuvem no Brasil.
Segundo o Downdetector, mais de 2 mil empresas registraram interrupções simultâneas hoje. O impacto global atingiu milhões de usuários e expôs um ponto cego: a economia mundial está hospedada em servidores que ninguém vê e todos confiam.
Temos que concordar que é uma ironia brutal: a “nuvem”, símbolo máximo da modernidade e da estabilidade digital, tornou-se hoje o ponto de maior vulnerabilidade, onde basta uma falha para que bilhões evaporem. O consumidor, claro, não entende e, nem precisa entender. Ele só vê a tela travada, o carrinho que não fecha e o aplicativo que não abre. E, nesse momento, a reputação que levou anos para ser construída se perde em minutos.
Mas é preciso entender que o verdadeiro risco não está na falha, porém, na ausência de um plano, porque o problema não é o apagão em si. É a falta de contingência, de visão sistêmica, de governança digital.
Muitas empresas ainda tratam infraestrutura de TI como despesa, não como estratégia. Querem ser digitais, mas não estão preparadas para a falha do “digital”. E falha. Sempre vai falhar, porque não existe risco zero. A diferença entre perder um dia e perder o negócio é simples: quem antecipa o caos e age com prevenção, lucra com ele (ou pelo menos não perde).
O colapso soa como alerta e oportunidade, onde este apagão cibernético é um lembrete claro de que transformação digital não é sobre automação: é sobre resiliência. Empresas sem um plano de prevenção, governança e gestão de crise e que, não revisam seus protocolos de redundância, backup e comunicação de crise estão pedindo para ser notícia, não pela inovação, mas pelo colapso.
Estamos próximos da Black Friday, que deve salvar o ano de muitos varejistas. Neste que é o maior evento do varejo, onde cada segundo vale milhões, o que vivenciamos hoje foi mais que uma falha: foi um espelho. Mostrou quem está preparado e quem apenas “acha” que está digitalizado.
Listei as lições estratégicas para o varejo a partir do que aconteceu: Planejar para a falha, não para o funcionamento: ter nuvem não basta, é preciso resiliência arquitetônica, redundância, simulações de desastre e planos de continuidade.
Evitar opções únicas: se toda a operação depende de um provedor ou região, existe vulnerabilidade. Avaliar opções como multi-cloud, redundância e diversificação, são ações preventivas.
Comunicação faz parte da estratégia: se houver uma falha, informe rapidamente seus clientes, com muita clareza, empatia e ações futuras. Em situações desta natureza, ser transparente é mais importante do que garantir o uptime.
Monitorar e reagir rápida: as estatísticas indicam uma demora em mais de 30 minutos para detectar falhas, podem perder até 70% do valor de recuperação para as empresas.
Tornar a continuidade um valor corporativo: ações como treinamentos, integração de áreas de negócio com TI, definição de calendários de backups operacionais, ajudam na cultura e entendimento que transformação digital sem plano B é uma ilusão que custa caro.
Enquanto tudo para, aplicativos deixam de funcionar, sites travam, as perdas fazem o dinheiro sumir em um silêncio ensurdecedor.
1- Impacto financeiro direto (fontes: Forbes, Chain Store Age e UpGuard): US$ 9 mil/minuto é o custo médio global de downtime em grandes varejistas.
US$ 2,6 milhões em 13 minutos é a perda estimada em um evento da Amazon.
US$ 9,95 milhões/ano é o custo médio anual de interrupções em operações de varejo.
+60% das empresas levam mais de 30 minutos para detectar falhas críticas em suas operações.
2 – Percepções e comportamentos do cliente (fontes: PwC 2023 e Zendesk 2024): 71% abandonam as marcas após uma experiência digital ruim.
48% não retornam nas duas semanas seguintes.
89% dos clientes esperam comunicação imediata.
67% veem falhas como “falta de preparo”, não acidente técnico.
3 – Cenário AWS (fontes: Synergy Research 2025 e Data Center Knowledge 2024): Cerca de 31% do mercado global de nuvem pertence à AWS.
milhares de workloads críticos estão concentrados na Virgínia, EUA.
Desde 2017, foram registradas 12 grandes falhas globais.
4 – Impacto na Black Friday (fontes: Neotrust 2024, Ebit | Nielsen 2024): E-commerce brasileiro faturou R$ 7,1 bilhões em 2024.
Cada minuto de instabilidade tem um custo aproximado de R$ 1,4 milhão.
R$ 160 milhões em perdas potenciais podem ocorrer em apenas 2 horas de falha.
Ao fim de tudo, o grande aprendizado deste evento não está no tempo que o site/aplicativo ficou fora do ar ou ficou instável, mas na lacuna de ações preventivas que o evento trouxe à tona. Grande parte do varejo vive a ilusão de que tecnologia é garantia de crescimento, mas esquece que se não houver resiliência, é um crescimento baseado na crença de uma sorte inconstante.
Vivemos um cenário onde cada minuto de estabilidade digital é capital de confiança acumulado. E confiança tornou-se o ativo mais caro desta era digital.
A competitividade digital inicia-se na capacidade de funcionamento mesmo quando o resto do mundo para. Um aprendizado importante é que a transformação digital não termina na automação, ela começa no caos. Porque lucro sem risco é ilusão. E estar preparado para novos apagões é o novo diferencial competitivo.
• Por: Anderson Ozawa, professor da FIA Business School, estrategista empresarial, especialista em transformação de resultados, e idealizador do método Pentágono de Perdas. À frente da AOzawa Consultoria, lidera um ecossistema de soluções que combina inteligência prática, performance financeira e visão estratégica para gerar impacto real nos negócios. | Aozawa Consultoria — Fundada em 2014 pelo professor Anderson Ozawa, a AOzawa Consultoria é especializada em soluções estratégicas, com foco em transformação, governança e impacto sustentável. Atua com uma abordagem personalizada, unindo experiência executiva de alto nível a um profundo compromisso com a entrega de valor real aos clientes com o método Pentágono de Perdas. | www.aozawaconsultoria.com.br