O sino do pregão toca igual para todos, o acesso não. O capital ainda guarda fronteiras invisíveis que separam desejo de possibilidade. Ainda assim, sinais de mudança começam a aparecer. Em 2024, menos de 10% das mulheres brasileiras fizeram algum tipo de investimento, segundo a ANBIMA. Para 2025, metade daquelas que ficaram de fora já declarou a intenção de entrar, movida pela busca de segurança e pela vontade de ampliar o poder de consumo.
Na bolsa, esse movimento também acontece. Entre 2020 e 2024, o número de investidoras cresceu 85,6%, alcançando quase 1,4 milhão de cadastros. Ainda somos, no entanto, 26% do total, uma minoria que ao mesmo tempo revela potência e expõe ausência. É nesse espaço entre conquista e lacuna que se mede o tamanho do desafio e a força da oportunidade.
Investir, afinal, deixou de ser um ato técnico em busca de retorno. Tornou-se governança da vida real. Cada decisão financeira molda tempo, escolhas e proteção. Quando o capital é conduzido por mulheres, famílias ganham resiliência, comunidades se fortalecem e o círculo de autonomia se amplia.
Esse movimento, porém, esbarra em barreiras já conhecidas e persistentes: jornadas de cuidado que comprimem a capacidade de poupar, interrupções de carreira que reduzem acúmulo de patrimônio, crédito mais caro e produtos ainda comunicados em linguagem excludente. Educação financeira amplia repertório, mas não resolve sozinha a continuidade.
É por isso que a infraestrutura importa. Transparência salarial corrige assimetrias que drenam capacidade de investimento. Licença parental compartilhada distribui responsabilidades e devolve tempo. Crédito para empreendedoras, com critérios objetivos, reduz fricções históricas. Serviços de cuidado acessíveis liberam horas para o planejamento. Reguladores e mercado têm papéis complementares nesse desenho: estabelecer padrões claros de divulgação, oferecer produtos alinhados a ciclos de vida distintos e adotar métricas de risco que respeitem realidades plurais.
O que está em jogo vai muito além da performance individual. Investir é financiar projetos de vida: a educação dos filhos, a moradia, o empreendedorismo, a longevidade. Cada mulher que governa o próprio patrimônio amplia sua margem de escolha e, ao fazê-lo, fortalece o entorno.
Promover ambientes propícios para que mais mulheres possam investir é, portanto, uma decisão coletiva. É infraestrutura econômica e também cultural. É abrir espaço para que a autonomia individual se converta em resiliência social. Quanto mais mulheres governam o próprio patrimônio, mais sólida se torna a base sobre a qual nos apoiamos como sociedade. Juntos, podemos criar um ecossistema em que investimentos, mais do que capital, multipliquem possibilidades.
• Por: Luciana Zanini, diretora- executiva de Finanças, pessoas e estratégia (CFO) no Inhotim, Luciana Zanini tem uma sólida trajetória em finanças, mercado de capitais, relações com investidores e governança corporativa. Com uma visão estratégica orientada a resultados, é reconhecida por sua habilidade em liderar transformações organizacionais de alto impacto, alinhando o desenvolvimento de pessoas à excelência financeira. A executiva adota uma visão humanizada das finanças, acreditando que o valor de uma organização está em seu capital humano. Sua experiência inclui passagens por grandes instituições, como Itaú BBA, EY, Bloom Energy, Fialho Salles Advogados, LOG Commercial Properties e Seven Capital. Possui um MBA pela Tuck School of Business at Dartmouth, o que fortalece sua sólida formação em finanças e negócios e agrega uma visão global e estratégica ao seu perfil de liderança.