Bloco é o segundo maior destino de exportações brasileiras na Europa. Com comércio e investimentos bilaterais em alta, acordo amplia possibilidades de exportação para a indústria.
A Confederação Nacional da Indústria (CNI) considera um passo estratégico o Acordo de Livre Comércio entre o Mercosul e a Associação Europeia de Livre Comércio (EFTA) assinado no dia 16 de setembro (terça-feira) no Palácio Itamaraty, Rio de Janeiro(RJ). Atualmente, o Brasil é o presidente pro tempore do grupo, que reúne como estados partes a Argentina, Uruguai, Paraguai, Bolívia e Venezuela [suspensa] mais Chile, Colômbia, Equador, Guiana, Panamá, Peru e Suriname como estados associados. Já a EFTA é formada por quatro países europeus: Suíça, Noruega, Islândia e Liechtenstein. Na avaliação da indústria, o acordo fortalecerá as relações econômicas do bloco sul-americano com países europeus e propiciará um incremento nas exportações do Brasil para os países que compõem o EFTA: Suíça, Noruega, Islândia e Liechtenstein. Considerando produtos agrícolas e industriais, aproximadamente 99% das exportações brasileiras terão acesso em livre comércio imediato aos mercados da EFTA quando o acordo comercial estiver em vigor.
— Esse acordo traz novas oportunidades para aumentar os investimentos e a presença dos nossos produtos no comércio internacional, sobretudo porque oferece melhores condições de acesso a mercados relevantes e com grande poder de consumo. A conclusão do acordo vem, ainda, num momento muito importante para a indústria nacional, que enfrenta enormes perdas relacionadas ao tarifaço dos Estados Unidos — afirma o presidente da CNI, Ricardo Alban.
O bloco europeu reúne 14,3 milhões de habitantes, PIB de US$ 1,4 trilhão e ocupa a quarta posição global como origem de investimentos estrangeiros diretos, o que reforça seu papel como mercado prioritário para ampliar a integração internacional do Brasil.
As relações econômicas entre Brasil e EFTA vêm se fortalecendo na última década. A corrente de comércio cresceu 36,7% no período. De acordo com avaliação da CNI, o Brasil dispõe de mais de 700 oportunidades de exportação ao bloco, que se consolidou como o terceiro maior parceiro do país no comércio de serviços. Além disso, os investimentos bilaterais atingiram recorde histórico em 2023, sendo US$ 46,2 bilhões da EFTA no Brasil e US$ 11,7 bilhões do Brasil na EFTA, confirmando a relevância da parceria.
A exportação para a EFTA traz retorno econômico vantajoso ao Brasil. O bloco tornou-se o segundo maior destino das exportações brasileiras na Europa em 2024 ao ultrapassar o Reino Unido, ficando atrás da União Europeia. O valor exportado somou US$ 3,1 bilhões nesse ano. Cada R$ 1 bilhão exportado do Brasil para o bloco resultou em 19,8 mil empregos, R$ 448,7 milhões em massa salarial e R$ 3,4 bilhões em produção.
Acordo reduz tarifas e diminui burocracia — A CNI, por meio da Coalizão Empresarial Brasileira, desempenhou papel relevante no apoio ao processo de negociação do acordo comercial. Desde a Consulta Pública de 2015, coordenou a participação de entidades setoriais, articulou o posicionamento do setor privado e manteve diálogo constante com o governo brasileiro. Com essa atuação, buscou garantir que as prioridades da indústria fossem consideradas ao longo das tratativas, equilibrando sensibilidades e interesses do setor.
O acordo Mercosul-EFTA é amplo e abrange compromissos modernos de integração econômica. Seu escopo inclui acesso a mercados de bens, regras de origem, serviços, investimentos, propriedade intelectual, compras governamentais, defesa comercial, barreiras técnicas ao comércio, medidas sanitárias e fitossanitárias, facilitação de comércio, concorrência, desenvolvimento sustentável e solução de controvérsias.
Entre os benefícios, estão a redução total de tarifas de importação para a indústria, regras de certificação de origem flexíveis, redução de barreiras técnicas e a proteção de propriedade intelectual, incluindo indicações geográficas.
Principais compromisso de acesso aos mercados do Mercosul e da EFTA — O capítulo 02 do Acordo Mercosul-EFTA estabelece um compromisso abrangente de liberalização tarifária no comércio de bens. No caso do Brasil, considerando produtos agrícolas e industriais, aproximadamente 99% das exportações brasileiras terão acesso em livre comércio aos mercados da EFTA.
Oferta do Mercosul: o bloco comercial se compromete a liberalizar tarifas de importação para mais de 90% do universo tarifário, de forma imediata ou escalonada, conforme cestas de desgravação de quatro a 15 anos. Para os demais produtos, foram previstas quotas tarifárias para produtos como laticínios, chocolates e fórmulas infantis, bem como margens de preferência de 10% a 50% (com desgravação imediata ou em até 5 anos) e ainda uma lista de exclusões.
Oferta da EFTA: Todas os compromissos assumidos pela associação europeia serão aplicados no primeiro dia de vigência do acordo comercial. A EFTA eliminará integralmente as tarifas de importação do setor industrial e pesqueiro. Nos produtos agrícolas, o acordo garantirá acesso preferencial aos principais produtos exportados pelo Brasil, como carnes bovina, de aves e suína, farelo de soja, milho, café torrado, álcool etílico, dentre outros. Essas condições, contudo, não são uniformes entre os membros: Suíça e Liechtenstein ofereceram oito mil toneladas para carne bovina, enquanto a Noruega limitou a apenas 665 toneladas.
Para garantir que os exportadores do Mercosul possam aproveitar integralmente as quotas oferecidas, foram definidos dois mecanismos de administração: quotas preferenciais bilaterais específicas para o Mercosul e tarifas intraquotas aplicáveis a produtos já sujeitos a quotas globais de importação.
De certificados a rótulos bilíngues: adequação documental será peça-chave para transformar o acordo em oportunidades reais. A redução tarifária e a ampliação do acesso prometem ganhos expressivos. Porém, especialistas alertam que o principal desafio está na adequação regulatória e documental.
—Não basta ter produto competitivo, é preciso ter papelada competitiva —afirma Gabriel Del Bello, especialista em comércio exterior e fundador da Gold Traduções.
—Um certificado de análise mal traduzido, uma ficha de segurança incompleta ou um rótulo desalinhado ao padrão europeu podem travar um embarque inteiro e comprometer contratos—.
—Esse acordo pode ser um divisor de águas para a indústria brasileira. Mas ele só vai beneficiar quem estiver pronto para responder rapidamente às exigências do mercado europeu. Documentação é um gargalo invisível que pode definir quem ganha e quem perde competitividade — complementa Del Bello.