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02/08/2025

O sócio ainda é advogado ou já virou gestor? O dilema da liderança jurídica

A figura do sócio em escritórios de advocacia sempre esteve associada à excelência técnica, à reputação no mercado e à condução dos casos mais estratégicos do portfólio do escritório. No entanto, à medida que o mercado jurídico se transforma e se torna mais competitivo, surge um novo questionamento: o sócio ainda é, primordialmente, advogado — ou já deveria ter assumido, de forma plena, o papel de gestor?

Essa transição entre a atuação técnica e a liderança executiva não é trivial. O que está em jogo é a própria sustentabilidade do negócio jurídico. Escritórios que crescem, expandem suas áreas de atuação, contratam profissionais e lidam com dezenas (ou centenas) de clientes não podem mais prescindir de uma gestão profissional, estratégica e integrada. E é exatamente aí que reside o dilema: os sócios, formados para pensar o Direito, raramente foram preparados para pensar o negócio.

A armadilha da especialização técnica —Muitos sócios fundadores, mesmo após anos de experiência, ainda estão mergulhados na rotina jurídica — peticionando, participando de audiências, redigindo pareceres. Não há demérito nisso. Ao contrário, essa entrega técnica pode ser essencial, sobretudo em áreas que exigem profundo conhecimento e atuação personalizada. No entanto, o problema surge quando essa dedicação impede a visão de médio e longo prazo sobre o próprio escritório. Sem gestão, não há crescimento estruturado. E sem crescimento estruturado, o talento técnico, por mais brilhante que seja, corre o risco de ser desperdiçado.

Essa armadilha é reforçada pela cultura jurídica tradicional, que valoriza o domínio das leis e dos tribunais, mas ignora — ou minimiza — a importância da administração, do planejamento, da análise financeira, do marketing jurídico e da governança interna.

Gestão não é secundária: é estratégica — Assumir a gestão de um escritório não significa abandonar a advocacia. Significa reconhecer que a atividade jurídica, hoje, é também um empreendimento. Um escritório é, antes de tudo, uma organização que precisa entregar valor ao cliente com eficiência, consistência e viabilidade econômica. Isso exige visão estratégica, tomada de decisão baseada em dados, controle de indicadores e uma cultura organizacional clara.

Negligenciar a gestão é abrir espaço para ineficiências que comprometem o resultado: baixa rentabilidade, falta de controle sobre os honorários, equipes desmotivadas, ausência de metas, conflitos societários e perda de oportunidades no mercado. Ao contrário do que muitos imaginam, o ato de gerir não é um desvio de função — é uma função essencial para garantir a continuidade e a evolução do negócio jurídico.

Os impactos da falta de profissionalização— A ausência de uma liderança efetivamente gestora costuma produzir efeitos silenciosos no início, mas profundamente danosos no médio prazo. É comum encontrar escritórios em que não se sabe exatamente quanto custa a operação mensal, qual é a margem de lucro dos principais clientes ou quais áreas são efetivamente rentáveis. O sócio, nesse contexto, atua de maneira reativa: apaga incêndios, resolve crises pontuais, mas não estrutura caminhos consistentes de desenvolvimento.

Além disso, a falta de profissionalização pode gerar conflitos internos. Sócios que acumulam funções, sem clareza de papéis ou critérios objetivos de avaliação, tendem a sobrecarregar-se e, eventualmente, gerar ressentimentos na equipe. A meritocracia fica comprometida, o clima organizacional se deteriora e o crescimento do escritório torna-se limitado pela capacidade individual dos líderes.

Caminhos para uma liderança jurídica mais estratégica—A profissionalização da gestão nos escritórios de advocacia pode se dar de forma progressiva, sem que os sócios abandonem completamente a atuação técnica. O ponto central está na clareza de funções e na definição de prioridades. Abaixo, alguns caminhos recomendáveis:

Definir papéis com objetividade — É fundamental que o escritório saiba quem responde por quê. Se um sócio acumula função técnica e administrativa, que isso esteja claro e seja reconhecido internamente. A liderança não pode estar dispersa.

Criar uma estrutura de gestão mínima — Implantar rotinas de acompanhamento financeiro, definição de metas, reuniões periódicas de planejamento e avaliação de desempenho são iniciativas simples, mas transformadoras. A gestão não precisa ser complexa — precisa ser funcional.

Delegar o que não é estratégico — Muitos sócios perdem tempo com tarefas operacionais que poderiam ser atribuídas a outros membros da equipe ou até mesmo a prestadores externos. Delegar não é abrir mão de controle, é abrir espaço para decisões mais relevantes.

Investir em formação gerencial — Cursos de liderança, gestão de pessoas, finanças para não financeiros e planejamento estratégico são hoje amplamente acessíveis e podem transformar a forma como os sócios conduzem o negócio. A competência técnica jurídica não exclui a necessidade de competências de gestão.

Avaliar a possibilidade de contratar um gestor profissional — Alguns escritórios, em fases mais avançadas de maturidade, optam por incluir na equipe um gestor administrativo ou um diretor executivo que fique à frente da operação. Isso libera os sócios para atuar de forma mais estratégica ou focar naquilo que fazem de melhor.

A mudança de mentalidade: do sócio advogado ao sócio gestor — A grande transformação não está apenas na criação de estruturas ou ferramentas, mas na mudança de mentalidade. É preciso compreender que o sócio é, acima de tudo, responsável pelo futuro do escritório. Essa responsabilidade ultrapassa o domínio jurídico e exige visão empresarial.

O sócio gestor não abandona o Direito. Ele o eleva. Ao cuidar da gestão, garante que o escritório tenha perenidade, que os talentos floresçam, que os clientes sejam atendidos com excelência e que a reputação construída ao longo de anos seja sustentada por bases sólidas.

O dilema entre ser advogado ou gestor é, na verdade, uma falsa dicotomia. O sócio pode — e, em muitos casos, deve — transitar entre os dois papéis, desde que o faça com consciência, equilíbrio e preparo. A liderança jurídica do futuro será cada vez mais híbrida: alguém capaz de interpretar contratos e balanços, de elaborar teses e conduzir equipes, de entender o cliente e ler o mercado. E, sobretudo, alguém capaz de tomar decisões que posicionem o escritório como uma organização jurídica sustentável, inovadora e estratégica.

Por: Fernando Henrique de Oliveira Magalhães, CEO da OM Assessoria & Consultoria Business, é graduado em Economia pela Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo (FEA-USP), turma de 1985, sua formação de base foi concluída no Colégio Santo Américo, onde finalizou o ensino médio em 1981.

Ao longo de sua trajetória, construiu uma base sólida em gestão, estratégia e finanças, com ênfase especial na estruturação e desenvolvimento de negócios. Em 2018, concluiu o curso de Planejamento Estratégico para Escritórios de Advocacia na GVlaw, da Fundação Getúlio Vargas, e participou do programa “Melhores Práticas de Gestão de Escritórios de Advocacia”, promovido pela Totvs. No ano seguinte, aprofundou sua atuação no segmento jurídico com a especialização em Gestão Jurídica Estratégica pela FIA – Fundação Instituto de Administração.

Sua experiência também se estende ao varejo e ao franchising, tendo concluído diversos programas voltados à gestão e desempenho operacional. Entre eles, destacam-se os cursos “Finanças para Varejo” e “Gestão de Lojas e Negócios”, ambos promovidos pela Growbiz, além do “Programa de Treinamento para Gerentes de Varejo” e “Técnica de Vendas para Varejo”, ministrados pelo Grupo Friedman. Também integrou a “Franchising University”, iniciativa do Grupo Cherto, voltada à profissionalização da gestão de redes de franquias.

Além disso, possui fluência em inglês, tanto na comunicação oral quanto escrita, resultado da formação completa — do nível básico ao avançado — cursada na Associação Alumni entre 1987 e 1990.

Em 2018 finalizei Curso de Especialização em Planejamento Estratégico para Escritórios de Advocacia na GVLAW, da Fundação Getúlio Vargas, além de concluir o curso Melhores Práticas de Escritórios de Advocacia ministrado na TOTVS.

Em 2019 finalizei mais um Curso de Especialização em Gestão Jurídica Estratégica na FIA – Fundação Instituto de Administração.