Perigos da suspensão do monitoramento de combustíveis.
No final de junho, a ANP anunciou a decisão de suspender, entre os dias 1 e 31 de julho, o Programa de Monitoramento da Qualidade dos Combustíveis (PMQC), após o congelamento de R$ 35 milhões em seu orçamento pelo governo federal, que prejudicou uma importante ferramenta de controle de qualidade dos combustíveis comercializados em todo o país. O fator alarmante é que sem o devido controle de qualidade por fiscalização, os proprietários de veículos, os postos e até o meio ambiente ficam vulneráveis.
A gravidade desta medida fica evidente quando traçamos um histórico de contingenciamento: a verba discricionária, corrigida pelo IPCA, despencou de R$ 749 milhões em 2013 para R$ 134 milhões em 2024. Embora tenha tomado um pequeno fôlego com o aumento previsto no orçamento de 2025 para R$ 140,6 milhões, agora caiu para R$ 105,6 milhões, acumulando uma redução de aproximadamente 86%.
O PMQC coleta algo em torno de 16 mil amostras de gasolina, etanol e diesel em vários pontos do país, coibindo fraudes como teor de álcool acima do permitido na gasolina e desvio de volume de até 2,5% nas bombas, conforme relato da ANP. A suspensão deste programa abre um espaço ainda maior para adulteração por diluição ou mistura inadequada, prática que já atingiu até 40% das amostras coletadas.
Uma das primeiras consequências atingirá postos que optam por cumprir as normas de qualidade dos combustíveis, que ficarão em desvantagem no mercado diante de concorrentes desleais que irão vender “combustíveis batizados” a um preço menor.
Essa distorção do mercado, além de reduzir a arrecadação tributária e prejudicar postos comprometidos com boas práticas — que terão de escolher entre fechar as portas ou repensarem seus custos — irá afetar nós consumidores, que estaremos expostos a combustíveis adulterados que irão provocar, no mínimo, um aumento do seu consumo e danos a sistemas de ignição e injeção.
Assim, o que à primeira vista seria uma economia momentânea no combustível, irá gerar um gasto maior, devido a uma necessidade de manutenção mais frequente e substituição de peças do veículo. Uma consequência mais profunda, a médio e longo prazo, é pouco debatida publicamente: o monitoramento da qualidade de combustíveis é fundamental para reduzir emissões de poluentes e gases de efeito estufa. Combustíveis fora de especificação terão queima incompleta, aumentando a liberação de CO, HC, NOₓ e particulados, contribuindo para o aquecimento global.
Mas como nos defenderemos? Embora seja lícito a cada consumidor assumir seus riscos, devemos ter a ciência de que a fiscalização ausente deixa margem para práticas ilícitas, com consequências para as empresas sérias, para o ambiente e para nós consumidores. Cabe a nós cobrarmos do governo e do parlamento que retomem os recursos da ANP para que haja a retomada plena da fiscalização, garantindo um mercado de combustíveis seguro, justo e sustentável. Enquanto esta retomada não acontece, sempre é bom lembrar aquele sábio ditado popular: “O barato sai caro”.
• Por: Marcos Baroncini Proença, graduado em Engenharia Química e doutor em Engenharia Mecânica, além de Professor da Escola Superior Politécnica da Uninter.