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23/04/2025

Esgotamento feminino no trabalho

Por que as mulheres são as mais afastadas por transtornos mentais.

O Brasil enfrenta uma grave crise de saúde mental, refletida no expressivo aumento de afastamentos do trabalho devido a transtornos psíquicos. Em 2024, quase meio milhão de brasileiros precisaram se licenciar por condições como ansiedade e depressão, um crescimento alarmante de 68% em relação ao ano anterior, segundo dados do Ministério da Previdência Social. No entanto, um dado específico chama atenção: as mulheres representam a maioria desses afastamentos, totalizando 64% dos casos registrados.

O impacto das condições emocionais no desempenho profissional não é uma novidade. Em 2019, a Organização Mundial da Saúde (OMS) já apontava o Brasil como o país com a maior prevalência de transtornos de ansiedade no mundo, atingindo cerca de 18 milhões de pessoas. Desde então, a pandemia agravou ainda mais essa situação, provocando um aumento de 25% nos casos de depressão globalmente entre 2020 e 2021. No Brasil, o reflexo disso se manifesta especialmente entre as mulheres, que acumulam não apenas pressões profissionais, mas também responsabilidades domésticas e sociais.

Por que as mulheres são as mais afetadas? O predomínio feminino entre os afastamentos por transtornos mentais não é uma coincidência. Essa realidade está diretamente ligada a uma série de fatores estruturais e sociais, que tornam a rotina das mulheres mais exaustiva e estressante do que a dos homens. Entre os principais aspectos que explicam essa disparidade, destacam-se:

Sobrecarga de responsabilidades: Além da jornada profissional, as mulheres ainda são, na maioria dos casos, as principais responsáveis pelo trabalho doméstico e pelos cuidados com filhos e idosos. Mesmo quando trabalham fora, muitas enfrentam uma “segunda jornada” em casa.

Desigualdade salarial e insegurança financeira: Conforme dados do IBGE, em 2022 as mulheres receberam salários menores que os homens em 82% das principais áreas de atuação. Isso gera maior pressão financeira e necessidade de trabalhar mais para garantir estabilidade.

Liderança feminina nos lares: Pela primeira vez, o número de lares chefiados por mulheres no Brasil (49%) se equiparou ao dos liderados por homens. Isso significa que muitas delas são a principal — ou única — fonte de renda da casa, aumentando a carga emocional e psicológica.

Impactos da pandemia: Segundo a revista científica The Lancet, as mulheres foram desproporcionalmente afetadas pela crise sanitária em quatro aspectos fundamentais: desemprego, trabalho não remunerado, acesso à educação e violência de gênero. O efeito acumulado desses fatores segue afetando a saúde mental feminina.

Apesar de sofrerem mais com os transtornos mentais, as mulheres também têm um fator positivo a seu favor: elas buscam ajuda profissional com mais frequência do que os homens. Esse comportamento facilita diagnósticos precoces e a adoção de tratamentos adequados, evitando agravamentos.

Empresas na linha de frente: O que pode ser feito? A crise da saúde mental no ambiente de trabalho se tornou uma preocupação global, levando a Organização Mundial da Saúde a estimar que depressão e ansiedade causam a perda de 12 bilhões de dias úteis por ano no mundo, resultando em um prejuízo de US$ 1 trilhão. Diante desse cenário, o Brasil adotou medidas regulatórias para garantir um ambiente corporativo mais saudável.

A atualização da Norma Regulamentadora nº 1 (NR-1) prevê a inclusão dos riscos psicossociais nas fiscalizações trabalhistas. A partir de agora, as empresas serão obrigadas a identificar, avaliar e mitigar fatores que contribuem para o adoecimento mental dos funcionários.

Além da fiscalização mais rigorosa, as empresas podem adotar estratégias preventivas para promover a saúde mental no ambiente corporativo, como:

Mapeamento de riscos psicossociais por meio de testes organizacionais, como o CLIMOR (avaliação do clima de trabalho) e o EQVT (qualidade de vida no trabalho);

Análises individuais que ajudam a detectar fatores de risco específicos, como liderança disfuncional (EALA), resiliência emocional (EPR) e sinais de burnout (EBBURN);

Treinamentos e suporte psicológico para promover o bem-estar dos colaboradores.

Saúde mental não pode esperar — A crescente onda de afastamentos por ansiedade e depressão no Brasil não é apenas um problema de saúde pública, mas também um alerta para a exaustão das mulheres no ambiente de trabalho e na vida doméstica.

Se medidas eficazes não forem implementadas, o impacto dessa crise pode se refletir não apenas na produtividade das empresas, mas também na segurança econômica e social de milhares de famílias lideradas por mulheres. É fundamental que organizações e gestores reconheçam essa realidade e adotem políticas mais humanizadas, garantindo um ambiente laboral mais equilibrado e saudável para todos.

Por: Larissa Figueiredo Cerceau Guimarães, advogada, formada pela Universidade Presbiteriana Mackenzie (2017), com pós-graduação em Direito Processual Civil pela Fundação Getúlio Vargas (2020), graduanda em Psicologia pelo Centro Universitário Faculdade das Américas. Atualmente, atua na área comercial da Vetor Editora como consultora de testes e avaliação psicológica.